APAC masculina de São João del-Rei

24/07/2008

Fachada da APAC de São João del-Rei/MG.

O primeiro movimento apaqueano foi no teatro municipal, no ano de 2004. Foi exibido o vídeo do programa “Novos Rumos” apresentando a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados – APAC, como alternativa à realidade carcerária no Brasil. Entre os voluntários estavam Frei José, Sandim, Alzélia Zanetti, Edmundo e Maria de Nazaré “Fufa”, professores, universitários, policiais e membros da igreja/pastoral carcerária. A primeira ata assinada, no entanto, remete-se à reunião do Conselho da Comunidade, ocorrida no dia 25 de março de 2004 às 17h no salão do júri da Comarca de São João del-Rei.

Em abril de 2005, por incentivo da juíza, o grupo visitou a APAC de Itaúna/MG, referência no setor por ser a pioneira em Minas Gerais. Fuzatto um dos voluntários relembra: “Quando a gente chegou lá, eu disse que era isso que a gente queria fazer. É isso aqui!”. Por meio da visita,  o grupo conheceu o método apaqueano. Foram levados na visita três presos para conhecerem a unidade de Itaúna/MG.

A visita empolgou o grupo, que voltou com grandes ideias e  em  busca de um espaço para fundar a APAC na cidade. A tarefa indicada nesta fase era o estudo e a aproximação da realidade dos condenados. Para a segunda parte, o grupo buscou financiamento e patrocínio. Ainda com poucos recursos,  foram comprados produtos de higiene pessoal e alimentos para distribuir nas visitas,  enquanto se aproximavam da realidade e da rotina carcerária.

A APAC de São João del-Rei, ou também conhecida como APAC SJDR foi implantada juridicamente em 6 de outubro de 2005 por iniciativa, na época, da Juíza de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca, Dra. Rosângela de Carvalho Monteiro, juntamente com um grupo de voluntários de diversas áreas sociais que compunham a Pastoral Carcerária da comarca. Entre os voluntários, a liderança de Antônio Carlos de Jesus Fuzatto se destacou. Na época, Fuzatto era superintendente de ensino e já havia cumprido papéis sociais de grande impacto como: a fundação do Sindicato Único dos Trabalhadores da Educação – SindUTE; a Central Única de Trabalhadores – CUT e a fundação do Partido dos Trabalhadores.

Nesta trajetória, o então superintendente já havia sido vereador em São João del-Rei, também, deputado estadual. Mas desde os anos 80, Fuzatto se dedicava à assistência aos condenados. Depois de ter sido preso nos anos 80, o professor abraçou a causa. Antes da APAC SJDR, ele acompanhou a Pastoral Carcerária que também foi convidada para o grupo de voluntários. Em 7 de março de 2006 por meio de registro em ata, Antônio Fuzatto foi eleito Presidente da Diretoria Executiva e, para vice-presidente, Frei José da Cruz.

Neste período, ocorreu uma troca na Comarca. A Dra. Rosângela saiu, e o Dr. Ernane Barbosa Neves assumiu a vara de execução penal. Alinhado ao grupo de voluntários, e incentivado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG , o juiz acata a responsabilidade e o sonho de fazer a primeira unidade da APAC. Ernane encontra, no prédio da antiga Polícia Civil, no bairro que era conhecido como Cassoco, em 2007, um lar para a nova unidade apaqueana.

Prédio da antiga Polícia Civil, no bairro Cassoco em São João del-Rei.

A primeira iniciativa foi uma reunião para apresentar o Método APAC e o projeto da unidade para os prefeitos Cidinho, Donato e Padre  de São João del-Rei, Ritápolis e Santa Cruz de Minas, respectivamente. As cidades concordaram em encaminhar, no total, um montante de R$88 mil para custear a reforma do prédio. A mão de obra adveio dos presos do recém inaugurado Presídio Regional.

Após todos os esforços legislativos e a finalização da reforma, em 27 de junho de 2008 foi inaugurado o primeiro Centro de Reintegração Social – CRS na cidade. Na mesma época, os presos Nenzinho, Edson e André passaram por um treinamento e adaptação ao método apaqueano, durante três meses  em Itaúna, a fim de voltarem para São João del-Rei e repassarem os conhecimentos para os primeiros 57 recuperandos da APAC. O CRS, rapidamente, atingiu seu volume máximo de 57 recuperandos.

A implantação do CRS se deu acompanhada de vários obstáculos. Fuzatto conta: “Foi muito desafiador. Não sabíamos lidar com os recuperandos, não sabíamos lidar com a obra. Só sabíamos o que queríamos” .

Segundo Carlos Roberto Melo, Encarregado de Segurança, que, naquele período era recuperando: “Na época, o mais difícil era a credibilidade. Como era tudo novo, não havia confiança de que o CRS ia dar certo.”

Um dos problemas enfrentados pela APAC em seu início, foi a não aceitação do convívio dos recuperandos em meio urbano e central. De acordo com Daniela de Castro Fazzion, Encarregada Administrativa, apesar de eles já trabalharem para a prefeitura de São João del-Rei, por meio de convênio, as outras atividades executadas pelos recuperandos, como praticar atividades físicas, eram vetadas e duramente criticadas pela comunidade local, por serem consideradas uma ameaça para a segurança da sociedade civil. Muitas dessas atividades eram realizadas fora da unidade por não haver espaço dentro da APAC, dessa forma surgiu a necessidade de expandir a APAC para outra localidade.

Em relação ao ensino dos recuperandos, quando Fuzatto era Superintendente de Ensino, conseguiu implementar a primeira escola prisional em uma APAC, que se consolidou no ano de 2008. Ao longo de sua história, a unidade firmou importantes parcerias na área da educação regular, superior e, também a nível técnico, para exercício prático nas oficinas da unidade.

Considera-se de extrema importância que os recuperandos estudem e se profissionalizem. Dessa forma na unidade são-joanense a escola de ensino regular, E.E. Detetive Marco Antônio de Souza, trabalha desde o ensino fundamental até o ensino médio, tendo como primeira diretora Sra. Odete Sacramento. A escola já havia sido instalada no presídio regional, fazendo da APAC de SJDR seu segundo endereço.

Por necessidade de expansão territorial e, também, de capacidade da APAC, em 2009, o Presidente da APAC e o Juiz Dr. Ernane articularam a doação de um terreno junto à prefeitura de São João del-Rei. O patrocínio foi fornecido pelo governador Aécio Neves, para custear a construção. Orçada em cerca de R$1,63 milhão.

No ano seguinte,  foi repetida a fórmula que funcionou: mão de obra dos recuperandos, orçamento do Estado e parceria com a comarca, para tornar realidade os objetivos. Mas desta vez, os desafios se ampliaram, de acordo com o projeto. O terreno era muito grande, o trabalho e a demanda de mão de obra também. De primeira, houveram algumas fugas, tumultos e conflitos entre recuperandos, porém, à medida que surgiam, os problemas eram contornados.

Foi também em 2009 que houve o primeiro curso de voluntários para a APAC de São João del-Rei. Muitos dos voluntários passaram a trabalhar formalmente na APAC depois, como contratados.

Neste período, a APAC passou de 60 recuperandos, administrados por uma equipe de cerca de 12 pessoas, a ter 150, e uma unidade com cerca de 25 funcionários.

Após dois anos de obra e de muitos desafios, em 21 de novembro de 2013, foi inaugurada a nova sede da APAC masculina. Amplamente projetada para atender 180 recuperandos dos 3 regimes de cumprimento de pena – Fechado, Semiaberto e Aberto, essa unidade deu as boas-vindas aos seus recuperandos em junho de 2014.

Com um projeto arquitetônico específico, o CRS ocupa uma área de aproximadamente 6000 m2 e é composto por horta orgânica (e loja de mudas), pocilga e galinheiro, marcenaria, padaria, fábrica de tijolos ecológicos, biblioteca, serralheria, salas de aula, local para oficinas de artesanato e móveis de madeira de demolição e ferro, etc.

 

Horta orgânica APAC de São João del-Rei.

 

Marcenaria APAC de São João del-Rei.

Na estrutura da unidade há: dormitórios compostos por 2 beliches, refeitório; auditório equipado com mesa de som, telão, projetor e televisão; sala de laborterapia (aplica-se apenas no regime fechado); quarto de visita íntima; quadra esportiva; lavanderia; enfermaria, cantina; salão de eventos, banheiro para visitantes; sala de atendimento (psicológico e de trabalho social).

Essa expansão é acompanhada da, indispensável, criação de outros setores dentro da APAC, como de pedagogia, assistência social, psicologia, comunicação e saúde. A ideia era criar uma equipe de educação multidisciplinar dentro da unidade.

Segundo a Resolução SEDS/MG 1373 de 2013, a APAC masculina encontra-se posicionada no anexo IV, contando com um corpo técnico de 36 colaboradores entre técnicos, estagiários e funcionários.

Em 2014, na unidade são-joanense houve a primeira prova do ENEM sendo aplicada dentro de uma unidade da APAC. A partir daí o próximo passo foi o investimento no ensino superior, primeiramente, firmando parceria com o FEAD – Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais e, depois, com o Grupo Kroton (atualmente, Cogna Educação), que engloba as seguintes universidades: Anhanguera, Fama, Pitágoras, Unic, Uniderp, Unime e Unopar.

Em 2019, por meio de parceria entre TJMG, Cemig, FBAC, Minas pela Paz e Departamento Penitenciário de Minas, a APAC foi a primeira, no Estado de Minas Gerais, a ser contemplada pela implantação de um sistema de energia solar fotovoltaica.

APAC de São João del- Rei, a primeira unidade em Minas a contar com uma usina fotovoltaica.

No campo da educação em 2019 foi selada uma parceria entre a APAC de São João del-Rei e a Unopar – Universidade Norte do Paraná para a disponibilização de dezenas de bolsas de ensino superior para todas as APACs.

Além destas, durante sua trajetória, a APAC de São João del- Rei recebeu a Escola Móvel do SESI/SENAI, por meio da qual foram ministrados vários cursos técnicos profissionalizantes como de Mecânica de Autos (parceria com a ISVOR Fiat) e Panificação. Essa parceria com as APACs de todo país é uma iniciativa do Minas Pela Paz, juntamente com SENAI, SESI, SEBRAE, SENAC e Tio Flávio Cultural. O Minas Pela Paz, desde 2009, desenvolve o Programa Regresso, que estimula o empresariado a contratar egressos do sistema prisional. Dessa forma, o programa capacita recuperandos nas APACs mineiras, onde já foram ofertadas mais de 3.600 vagas, no total, através do SENAI e SESI para cursos de Educação de Jovens e Adultos e profissionalizantes.

Segundo relatório expedido pela APAC no ano de 2021, são ofertados os seguintes níveis de escolaridade: ensino fundamental, ensino médio, curso superior, curso técnico e pós-graduação. A unidade possui uma média anual de 70 formandos no ensino regular e certa de 60% dos recuperandos da APAC de São João del-Rei estão estudando em algum nível escolar. Em abril de 2021 foram registrados 119 alunos no ensino regular, 11 alunos no curso técnico, 1 aluno na pós-graduação e 49 alunos no ensino superior.

Durante seus primeiros 10 anos de funcionamento a APAC SJDR alcançou grandes méritos, como atingir a marca de 90% de recuperação, além de conseguir implementar novas atividades e parcerias entre a unidade e setores educacionais e profissionalizantes da cidade. O trabalho árduo reflete o desenvolvimento da unidade são-joanense, sendo ela referência nacional e mundial na aplicação da metodologia. A unidade já recebeu visitas de vários lugares do mundo e, também foi aclamada pela mídia nacional e internacional por meio de reportagens e documentários que destacaram seu sucesso.

Diante da situação da pandemia da Covid-19, a APAC se mobilizou e, por meio de doações produziram mais de 30 mil máscaras que foram doadas para empresas e demais órgãos da região.

São oferecidos aos recuperandos do regime semiaberto as oficinas profissionalizantes de: marcenaria, horta, carpintaria, fabrica de blocos, mecânica, produção agrícola, suinocultura, cozinha, padaria, horto, tijolos ecológicos.

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